quinta-feira, 30 de agosto de 2007
. abandono do ver .
As lentes dificultavam o cair das suas lágrimas, e as fazia embaçar.
A chuva turvava tudo e a impedia de molhar a cara, pois lá estavam elas, como impecilhos para se experimentar o choro do céu.
Os beijos apaixonados vinham acompanhados de uma inevitável cegueira momentânea, pois não se pode pedir à pessoa que se beija que ela pare de respirar, muito embora sua blusa seja habitualmente transformada em meio de apagar as marcas do amor.
O que fazer quando o mundo que se vê não é o que se deveria ver? E afinal, existe uma única forma de se realizar as coisas? Será que realmente enxergamos alguma coisa? Por que tantos míopes, astigmatas, hipermétropes ? Não será uma necessidade imperiosa da natureza de colocar seres no mundo que são obrigados a verem as coisas de novas maneiras, a desenvolver outros sentidos, uma vez que a visão confunde nomes, tropeça pelos caminhos e veste a meia pelo avesso?
Ou somos azarados, condicionados a usar um par de lentes na cara, que lhe mostram um mundo que muita vezes, era melhor nem se ver. Talvez os tropeços fossem mais vantajosos quando se há tanta dor e tristeza nos corações das pessoas.
Andou pensando em abandonar os óculos, equecê-los no fundo de uma gaveta e passar a ver o mundo como ele se mostra a ela.
E sentir a chuva na cara, o beijo apaixonado e tropeçar nos sentimentos da vida.
No meio do caminho, sempre há umas pedrinhas. Pros que vêem e pros que não.
E afinal, quem vê? As lentes, ou olhos atrás das lentes?
*
Foto: Miopia iluminada (por Mariana David)
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