Andei refletindo,motivada um pouco pelo inferno astral que me acomete todo fim de ano, sobre tecnologia, internet, orkut, e todas as outras parafernálias tecnológicas de que fazemos uso habitualmente.
Cheguei a uma conclusão bem simples: o que motiva as pessoas a bisbilhotarem, a engajarem-se numa verdadeira maratona virtual, quando as pessoas estão bem ali, ao seu lado, acessíveis até mesmo por uma forma simples de comunicação, o olhar? O que as motiva a sentarem na frente de um computador sem vida, enquanto o dia faz sol e está bom para nadar? Ou ainda, se eu caminhar na linha sócio-política, me pergunto, como essas pessoas conseguem se importar com a vida virtual, enquanto milhares morrem todos os dias, quando a fome e a violência se fazem reais, bem reais.
A forma de olhar o outro por aqui é baixa: espreitando, maquinando, coisa de gente que vê telenovela, que acha que bandido deve mesmo morrer (e acha Tropa de Elite um grande exemplo)e que acha que o Bush está no caminho certo. É assustador, se pensarmos o quanto a tecnologia ainda irá evoluir e consequentemente, a distância entre as pessoas se fará cada vez maior, todas espremidas em lan houses, em seus laptops, criando realidades em que o contato se mede por pixels, megabites etcs e etcs.
O orkut é uma ponto especial disto tudo, há quem use para deixar recados, outros para encontrarem amigos, outros acham uma pura perda de tempo e há ainda aqueles que usam simplesmente para bisbilhotar. Adoro internet, amo tecnologias, mas peraê! Nada substitui um abraço, um beijo, uma ligação ( ai, que saudades do tempo do telefone), até mesmo uma carta, um pombo correio! Algo que prove, neste mundo de cá, de que as pessoas gostam de você, se importam, te escutam, partilham de sonhos e do seu mundo.
Não vou me estender muito, até porque está um dia lindo de sol e vou para praia.
Meu mundo é real.
*
domingo, 23 de dezembro de 2007
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
. Tomáz não crê .
Sentado na areia da praia, Tomáz observava o ir e vir das ondas. Gostava de ir à praia, quando os momentos felizes decidiam deixar-lhe a sós. A praia estava quase deserta: ao longo do mar, um barco fazia sua travessia e, bem distante, caminhava uma moça, cambaleando com uma garrafa de vodka quase vazia, exaurida na noite que ela insistia em não abandonar.
Pensou que tudo isso era inútil, a travessia do barco, que sempre tinha que voltar, e a bebedeira da moça, que não era tão moça assim, que definitivamente iria acabar no banheiro vagabundo mais próximo onde suas pernas poderiam chegar. Preso aos seus sentimentos cinzas, Tomáz nem reparou que a moça entorpecida tinha sentado ao seu lado, roupa preta amassada, maquiagem borrada, hálito que certamente já havia percorrido muitos copos de bebida, quase não se via que havia ali uma mulher. Tomáz pensou em sair dalí, em deixar aquela criatura sozinha, exalando os seus podres poderes, mas estava muito cansado para qualquer coisa e só lhe restou ficar.
A mulher cantarolava um samba antigo, impossível de se decifrar ( Cartola ou Noel? Pensou o rapaz) e se jogava na areia, gargalhando muito alto, de forma que Tomáz não pôde deixar de notar qualquer outra coisa que não ela. No entanto, a mulher de lábios borrados não olhava para ele: continuava a cantar, a rir bem alto e a gritar: Tomáz era simplesmente invisível para ela.
Aquela indiferença começou a incomodar Tomáz, que começou a se sentir pequeno, miudamente pequeno, absurdamente pequeno. Ele gritava, mas ela não ouvia, tudo era agora uma estrita treva, plena de escuridão. Já sem forças, prestes a ser consumido pelas próprias entranhas, tal qual um inseto que se alimenta dos restos de outro, a moça parou em sua frente e lhe entregou um bilhete. Ele fez um enorme esforço, sua pequenez agora já era enorme, mas suas vistas alcançaram o papel, que trazia em letras vermelhas: ACREDITE.
Em quê, meu Deus, em quê?!! Tomáz ia gritando, berrando, mas a moça não mais lhe escutava, já estava bem longe, quase impercepitível. E ele ia diminuindo, diminuindo, sem saber no que acreditar, até que simplesmente se acabou. Era agora tudo cor de areia, e o insistente barulho do mar, de que ele tanto gostava.
E bem ao fundo, lá de longe, podia-se ouvir a moça bêbada cantar um samba de Cartola, enquanto Tomáz se desfazia, se dissolvia, por não saber acreditar.
*
--» Não postarei mais fotos aqui. Só textos.
Para fotos, acessem: www.flickr.com/photos/marianadavid/
Pensou que tudo isso era inútil, a travessia do barco, que sempre tinha que voltar, e a bebedeira da moça, que não era tão moça assim, que definitivamente iria acabar no banheiro vagabundo mais próximo onde suas pernas poderiam chegar. Preso aos seus sentimentos cinzas, Tomáz nem reparou que a moça entorpecida tinha sentado ao seu lado, roupa preta amassada, maquiagem borrada, hálito que certamente já havia percorrido muitos copos de bebida, quase não se via que havia ali uma mulher. Tomáz pensou em sair dalí, em deixar aquela criatura sozinha, exalando os seus podres poderes, mas estava muito cansado para qualquer coisa e só lhe restou ficar.
A mulher cantarolava um samba antigo, impossível de se decifrar ( Cartola ou Noel? Pensou o rapaz) e se jogava na areia, gargalhando muito alto, de forma que Tomáz não pôde deixar de notar qualquer outra coisa que não ela. No entanto, a mulher de lábios borrados não olhava para ele: continuava a cantar, a rir bem alto e a gritar: Tomáz era simplesmente invisível para ela.
Aquela indiferença começou a incomodar Tomáz, que começou a se sentir pequeno, miudamente pequeno, absurdamente pequeno. Ele gritava, mas ela não ouvia, tudo era agora uma estrita treva, plena de escuridão. Já sem forças, prestes a ser consumido pelas próprias entranhas, tal qual um inseto que se alimenta dos restos de outro, a moça parou em sua frente e lhe entregou um bilhete. Ele fez um enorme esforço, sua pequenez agora já era enorme, mas suas vistas alcançaram o papel, que trazia em letras vermelhas: ACREDITE.
Em quê, meu Deus, em quê?!! Tomáz ia gritando, berrando, mas a moça não mais lhe escutava, já estava bem longe, quase impercepitível. E ele ia diminuindo, diminuindo, sem saber no que acreditar, até que simplesmente se acabou. Era agora tudo cor de areia, e o insistente barulho do mar, de que ele tanto gostava.
E bem ao fundo, lá de longe, podia-se ouvir a moça bêbada cantar um samba de Cartola, enquanto Tomáz se desfazia, se dissolvia, por não saber acreditar.
*
--» Não postarei mais fotos aqui. Só textos.
Para fotos, acessem: www.flickr.com/photos/marianadavid/
terça-feira, 20 de novembro de 2007
. Uber Glam .
Dias desses fui participar, junto com mais um tanto de pessoas, da gravação do clipe do Coletivo Uber Glam, coletivo astral de rock indie e de severos flertes com o electro e suas vertentes, num apê devidamente decorado e preparado para uma festinha de mentira.
Na preparação, bebidas indo e vindo, lá pelas tantas, quando começaram a gravar, já estava aquele clima de auê, simulações de pegações, laranja mecânica e gente causando na piscina de bolinha instalada no quarto da luz vermelha. Eu, por conta do vestido que se favorecia da luz negra, acabei indo parar na cozinha, o que aumentou o meu nível alcóolico e minha futura exigência de ficar em outro cômodo em próximas empreitadas.
Acabei conhecendo um monte de gente legal, me divertí horrores e estou no aguardo do resultado, até porque, saímos arrasados do apê (vale lembrar,que os vizinhos,definitivamente, não curtem electro, rock e outras modalidades de ferveção) já combinando a festinha verdadeira de comemoração do clipe.
Ih!
*
Acessem: www.myspace.com/cugcug
Na preparação, bebidas indo e vindo, lá pelas tantas, quando começaram a gravar, já estava aquele clima de auê, simulações de pegações, laranja mecânica e gente causando na piscina de bolinha instalada no quarto da luz vermelha. Eu, por conta do vestido que se favorecia da luz negra, acabei indo parar na cozinha, o que aumentou o meu nível alcóolico e minha futura exigência de ficar em outro cômodo em próximas empreitadas.
Acabei conhecendo um monte de gente legal, me divertí horrores e estou no aguardo do resultado, até porque, saímos arrasados do apê (vale lembrar,que os vizinhos,definitivamente, não curtem electro, rock e outras modalidades de ferveção) já combinando a festinha verdadeira de comemoração do clipe.
Ih!
*
Acessem: www.myspace.com/cugcug
sábado, 17 de novembro de 2007
. os fantasmas de minha avó .
É interessante quando conseguimos reconhecer o nosso medo, reconhecer esse monstro de asas que se esparrama dentro de nós e coloca o coração é um lugar não-comum, saltando à boca.
Sentada na sala, junto a minha vó, me debrucei sobre pilhas de fotografias antigas, de um preto e branco resistente às folhas do tempo e de histórias que, para minha avó, acabaram de bater a porta e foram para a rua. Me dei conta de um certo caráter fantasmagórico que a fotografia encerra: as pessoas mudam, envelhecem, morrem, e ao mesmo tempo continuam ali, jovens, iguais e vivas, nas fotografias antigas que minha vó guarda em muitas caixas. E ela ia me contando: esse daqui era irmão do seu avô, essa daqui era minha amiga de escola, aquele lá está doente, ah, essa daqui fez 80 anos mês passado! Essa sou eu, com 13 anos, quando a Manoel Dias era toda uma praia. Ó, essa minha amiga morreu aos 26 anos, tão novinha... E vou sendo consumida por um misto de alegria e medo, muito medo. Fico pensando, um dia serei eu a olhar as minhas fotos antigas e a chorar pelos que já se foram, a rir das festas de carnaval, a folhear a minha junventude com mãos rugosas, vividas pelos anos que não voltam mais. Senti medo desse poder da fotografia, de nos levar a cheiros que não podemos mais sentir, a sorrisos que não podemos mais dar, a pessoas que não podemos mais tocar.
E enquanto minha vó ia me contado os fragmentos retratados da sua vida, eu ia sendo tomada por uma melancolia absurda, mas não conseguia parar de olhar as fotos, estava presa àquelas estórias, àquelas dedicatórias no fundo das fotos, e como não pude deixar de olhar, me calei e acompanhei a mãe da minha mãe no redescobrimento dos seu fantasmas ainda tão vivos.
*
Foto: a mãe da minha mãe. (por Mariana David).
sexta-feira, 16 de novembro de 2007
quinta-feira, 1 de novembro de 2007
. rios, pontes e overdrives .
A primeira vez que pisei no Recife foi há um ano atrás, dias antes do início do Carnaval e tendo apenas como referência as músicas do Chico Science sobre a cidade que, só depois de estar lá, fui entender porque ele a chamou de manguetown.
Fui recebida no aeroporto por um grupo de pessoas dançando ao som do frevo, e uma figura chamativa, com uma espécie de peruca colorida e óculos escuros (o caboclo de lança, dos tradicionais maracatus rurais). Tinha chegado, finalmente, a Pernambuco.
Bati muita perna pelas ruas do Recife. Dei sorte, pois me instalei num apê muito legal, bem no centro e pertinho das melhores coisas a serem vistas. Este apê pertencia a três amigos, que conheci em Salvador mesmo, e prontamente me receberam de braços abertos ( amigo queridos, amigos amados).
Não há nada melhor do que caminhar por uma cidade que não se conhece: cada esquina é uma surpresa, cada cantinho revela um novo olhar, um novo sabor, o sotaque é algo genial (adoro sotaques, todos eles, sem exceção) e o cheiro, ah o cheiro. O cheiro do Recife é bem característico: mangue, cheiro de lama! Existem inúmeras pontes no Recife, e elas passam bem acima do rio Capibaribe, que apesar de ter sido praticamente destruído pela urbanização desenfreada, conserva ainda um restinho de mangue, em pleno centro da cidade. O centro do Recife é parecido com o de Salvador, mas ao mesmo tempo, bem diferente. Enquanto que minha cidade corre por becos, ruas estreitas, as de lá são maiores, mais amplas. O centrão é como uma mistura do Comércio com a Avenida Sete: prédios imensos e um monte de gente nas ruas, fazendo de tudo. A confusão sonora impera, ouve-se de Chico ao brega (ritimo forte na terra), podendo-se, inclusive, se escutar um axé em algum carrinho de som que vende cds piratas ( o axé chegou lá com força, mas é proibido no Carnaval).
O carnaval do Recife é uma coisa maravilhosa: eu, que há anos boicotava o carnaval baiano e me refugiava em ares mais mansos, redescobri a delícia do que é a verdadeira festa de rua. Lá, o carnaval ocorre por toda a cidade, desde o Recife Antigo, até a periferia, onde, inclusive, alguns dos grandes nomes da música brasileira e pernambucana, tocam pro povo e sem frescura. Genial. Não ví nenhuma briga, ou confusão, apesar das ruas lotadas de gente, homens, mulheres, crianças, bichas loucas, modernetes, senhoras de idade, todos juntos, dançando frevo, arriscando no maracatu, fantasiando-se, num mundo cada vez mais sem fantasia. Vale mencionar que é tudo de graça minha gente, sem cordas, sem camarotes elitistas esmagando o povo e a tradição de se brincar na rua. É só chegar e se jogar.
Descobrí muita música boa no Recife, além de Nação Zumbi ( que são muito queridos e respeitados pelos pernambucanos), Mundo Livre S/A e Otto: Siba e Fuloresta do Samba, Mestre Salustiano, Maciel Salu, Lia de Itamaracá, Coco de Arcoverde, muita coisa de raiz, som fino e de qualidade. Recife é coisa boa de se ouvir.
Há ainda a parte mais tradicional do carnaval, que ocorre na Zona da Mata, com as folias dos Maracatus Rurais, Caboclinhos, Cavalo Marinho, tanta coisa, dança, música, respresentação, cultura popular resistindo e se recriando aos ditames do tempo. Ano que vem, meu destino é certo: vou desbravar a nobreza que vem da mata.
O Recife é meu segundo lar, onde fiz amigos verdadeiros, onde me reconheci, onde me apaixonei.
Eu também estou enfiada na lama.
*
Foto:andando em coletivos e becos (por Mariana David).
quinta-feira, 25 de outubro de 2007
. a alegria é muda .
Palavra bonita é o silêncio. Bonita e cheirosa.
Adoro os instantes de silêncio, os momentos em que tudo se cala e a oportunidade de expressões mais sutis, que escorregam pelas beiradas, se faz naturalmente querida.
Muitos acham esses hiatos de aparentes vazios carregados de constrangimento, e muitas vezes os são: somos todos escravos das palavras. No entanto, eu me esforço para não achar estranho quando tudo se cala, quando as palavras simplesmente dilúem-se em algum canto nosso. Aproveito a oportunidade, não é sempre que acontece. Vivemos em mundo barulhento onde o silêncio, a calma que adormece nos lábios, é sinônimo de tristeza (ou o que é que você tem, está tão calada!). O mais interessante é que, muitas vezes, é justamente este calar que nos traz alegria, nos coloca em estado de compreensão e, por que não, de admiração diante do mundo. E vejo mais, e sinto mais e escuto mais. Os sentidos ganham uma dimensão genial, às vezes chego até a me emocionar com a beleza que nos é oferecida em silêncio.
Já me perguntei por que temos dois olhos, dois ouvidos e uma boca: ouvir mais, ver mais e falar o necessário. Vejo tanta gente gastando palavra a tôa e percebo que ainda não conseguiram ver o que está bem estampado na cara.
Se estar em silêncio é estar triste, aceito a condição.
Minha felicidade não se encontra no dicionário.
*
Foto: Capricórnio(por Mariana David).
terça-feira, 23 de outubro de 2007
Tenho muitas dúvidas nesta minha vida, tantas, tantas, que às vezes sinto uma vontade imensa de tirar férias de mim mesma e ir para praia, não pensar em nada. Mas acho que isso, do pensar, refletir, característica genuinamente humana, é a nossa fonte de alegria e sim, também, de muito, muito dissabor.
Estarmos conscientes tem seu preço. A clarividência há muito é motivo de angústia para os seres humanos: pensar, esclarecer, elaborar, seja no campo da ciência, seja no seio da arte, fez e faz muita gente passar as noites em claro, procurando respostas para coisas, sentimentos, fenômenos que residem num mundo ainda não descoberto, ainda não partilhado.
Foi assim com o filósofo do mito platônico da caverna, que sai do mundo das trevas e alcança o real sentido das coisas, mas que tem que retornar para permitir que os outros, ainda em estado ignorante, também tenham acesso à maravilhosa e angustiante sensação que é o saber. Foi assim com o poeta, que à parte de tudo, traz consigo todos os sentimentos do mundo. Que fardo maravilhoso é o de trazer todos os sentimentos do mundo. Amor não é pouco. Cada um vai utilizando as suas armas para tentar compreender e explicar o mundo que nos cerca: uns pintam, uns fotografam, outros escrevem, há aqueles que falam, os que calam, muitos que choram e um tanto de outros que não estão nem um pouco preocupados com isso.
Não cheguei ainda a uma conclusão a respeito disso. É de causar um grande temor, também, ser privado de explicações sobre as coisas, que querendo ou não, nos fornece os mecanismos de intervenção no mundo. Pode-se fazer melhor, ou pior, conhecimento é artifício neutro: há os que fazem bom uso e os que não fazem. A bondade e a maldade no mundo andam lado a lado com a nossa capacidade de pensar, e tem certas coisas que, sinceramente, eu preferia nem saber.
Para algumas coisas eu gostaria de ser burra, não sofreria tanto.
*
Foto: Niemeyer (por Mariana David).
segunda-feira, 15 de outubro de 2007
quem bater primeiro a dobra do mar dá de lá bandeira qualquer, aponta pra fé e rema
é, pode ser que a maré não vire
pode ser do vento vir contra o cais
e se já não sinto os teus sinais
pode ser da vida acostumar
será morena?
sobre estar só eu sei
nos mares por onde andei
devagar
dedicou-se mais o acaso a se esconder
e agora o amanhã cadê?
doce o mar perdeu no meu cantar
* sem saco para escrever. música, então *
*
Foto: BahiaRio (por Mariana David).
Lugar sem comportamento é o coração.
Ando em vias de ser compartilhado.
Ajeito as nuvens no olho.
A luz daz horas me desproporciona.
Sou qualquer coisa judiada de ventos.
Meu fanal é um poente com andorinhas.
Desenvolvo meu ser até encostar na pedra.
Repousa uma garoa sobre a noite.
Aceito no meu fado o escurecer.
No fim da treva uma coruja entrava.
[ Manoel de Barros _ O livro das ignorãças ]
*
Foto: Auto meu (por Mariana David).
sexta-feira, 12 de outubro de 2007
sábado, 6 de outubro de 2007
. MabLee foi passear .
Apesar de conhecer muita gente, eu não sou uma pessoa de fáceis amizades. Sinto muita dificuldade em deixar uma pessoa entrar na minha vida, não porque acho que a pessoa não valhe a pena, mas porque sou muito tímida mesmo. Tenho a impressão de ter um bicho do mato dentro de mim, que me esconde atrás das árvores, dentro das tocas, debaixo da terra. Sou muito mais observadora do que protagonista, é bem verdade. Me comporto muitas vezes como uma mosquinha na parede, que tudo vê e não é vista (o cine olho de Vertov, cinema cru e direto). Mas, por mais que a timidez me esconda, inexplicavelmente, algumas pessoas conseguem chegar até a mim e mais, permanecem na minha vida maravilhosamente. Dou muito valor a estas pessoas, porque elas acreditam em mim e insistem em me terem por perto, por mais que o meu bicho do mato insista para eu me sentar na última fila.
Uma dessas pessoas chama-se Mab. Dona de nome de fada, essa linda menininha me pegou de surpresa e se instalou verdadeiramente no meu coração. Não houve esforço na nossa amizade, foi um encontro que fluiu desde o princípio e mostrou que veio para ficar.
Mab traz uma leveza para minha vida, traz cor, traz luz. Ela é pura inspiração, sentimento que dança e que me faz um bem danado! Minha paixão por fotografia cresceu junto com a minha paixão por ela, e coisa mais bonita do mundo é ver os seus olhos cor de esperança revelados pelo meu olhar.
Lhe desejo, meu bem, tudo de melhor no mundo, um boom de coisas novas, cores diferentes, sabores especiais, alegrias de nariz e movimento!
Levo você sempre comigo, meu pedaçinho de alegria!!!
* Amor sempre! *
*
Foto: A Rainha das Fadas (por Mariana David).
domingo, 16 de setembro de 2007
. pra cima .
Ontem, numa conversa de mesa de bar, conversávamos sobre amor. Especificamente, conversávamos sobre as formas de amar, as formas que se revestem os nossos intensos e mutantes sentimentos.
Meu amigo diz sentir medo. Medo que o seu pedaço de afeto se parta dele. Eu pensei e repensei. Mas ela é uma parte e não o todo. O todo é você, e já vem completo. Ele sabe disso, eu também. Entre um gole e outro, tentávamos chegar a uma conclusão sobre algo que é inconcluível, se é que esta palavra existe. Eu tenho optado pela liberdade. Não uma liberdade com asas de anjo emprestadas de uma loja de fantasias. Asas que brotam da minha cabeça, da leveza dos meus sentimentos. O amor deve nos fazer flutuar e não aterrar (para isso existem os pés). A idéia de um contrato social me soa como falida, o fato de que as pessoas entram naturalmente em um acordo de vontades. Não há naturalidade e sim escolhas. Devemos compreender as escolhas alheias. Se contrariar, sente e espere. Faça voto de silêncio, se for preciso. Se formos perceber, até os elementos que têm raízes possuem liberdade para se movimentarem (vejam as árvores: aterradas, mas com cabelos ao sabor do vento).
E eu disse ao meu amigo pra não se preocupar. E a gente pediu mais um copo, para que o seu pedaço de afeto também pudesse beber.
*
domingo, 9 de setembro de 2007
. e precisa? .
terça-feira, 4 de setembro de 2007
. Plebiscito Popular (se veio até aqui, leia com atenção) .
Estará ocorrendo, em todo o Brasil, de 1 a 7 de setembro, um grande plebiscito popular, cujo tema principal é a anulação da privatização da Vale do Rio Doce, uma das principais companhias de mineração do mundo.
O plebiscito é um dos instrumentos que a sociedade dispõe para fazer valer a sua vontade e o seu poder de atuação nas chamadas democracias, sejam elas diretas ou representativas, sendo garantido constitucionalmente. Através do plebiscito, o povo é consultado previamente sobre um determinado assunto, antes que ele vire lei, ou sobre a revogação de algo que já está instituído legalmente, como é a questão da Vale do Rio Doce.
Para quem não sabe, a companhia foi privatizada no ano de 1997, no governo FHC, por 3,3 bilhões de dólares. No entanto, este valor é considerado como irrisório, pois em apenas três meses, seu lucro foi superior ao referido preço da venda. O leilão foi considerado como fraudulento, uma vez que privilegiou as empresas privadas, dando-lhes oportunidades extraordinárias de auferirem lucros elevadíssimos.
O Brasil, ao realizar a privatização, ao meu ver, abriu mão da sua soberania e negou ao povo o direito que lhe é garantido democraticamente, sendo a companhia um órgão público e teoricamente, de todos.
Além deste tema, serão abordadas questões de fundamental importância para o nosso país: as dívidas interna e externa, a tarifa de energia elétrica, a reforma da previdência e a transposição do Rio São Francisco.
Em Salvador, há urnas na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas_UFBA (São Lázaro),
na Ucsal(Federação), no Comitê Baiano do Plebiscito Nacional (perto do Bar Quintal, no Campo Grande), na Piedade e em bairros populares.
Acho que isto diz respeito a todos nós, brasileiros, interessados em mudanças efetivas e reais. Não adianta apelarmos para a demagogia ou acreditarmos que transformações não acontecem. Isso seria querer assassinar a história e todos os movimentos que a fizeram acontecer. A luta é lenta, difícil, é verdade. Mas se ficarmos só teorizando e achando que o que está melhor é o que vem de fora, estaremos fadados à eterna condição de exilados em países alheios.
*
Foto: Acampamento do Movimento dos Sem Teto (MSTS) (por Mab Cardoso).
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
. a rata do Caetano e as nossas .
Todos nós já tivemos ou teremos algum rato ou rata a passear pelos nossos restinhos de comida. Puxe aí, bem no fundo das suas memórias e o tal rato, ou rata, irá aparecer para lhe lembrar do queijo que vc não comeu por inteiro.
O rato é um animal, de modo bem particular, odiado, repugnado, evitado pela grande maioria das pessoas. Conheço uma pá de gente que não pode nem ver o bichinho em desenho animado e que odeiam a Disney por seu símbolo máximo (e é pelo Mickey mesmo e não por qualquer outro discurso anti-capitalista ou anti estadosunidosdaamérica).
O rato, ou a rata, gosta do submundo. É da noite, dos bueiros. Curte uma sujeirinha, bitucas de cigarro, restos de comida japonesa,mc donalds ou resto do resto do resto de qualquer outra coisa. O rato e a rata são livres de preconceitos alimentares:traçam de tudo. Não se pode dar bobeira com eles. Não é a tôa que existe aquele famoso joguinho para crianças: cadê o arroz que estava aqui? O rato comeu. Cadê os aspargos que estavam aqui? O rato comeu. Cadê os restos de unha do pé que estavam aqui? O rato comeu! (era rato ou gato? De qualquer forma, o gato come o rato e consequentemente, todas as porcarias que ele colocou pra dentro).
O rato, ou melhor, a rata, ficou famosa recentemente no último álbum do Caetano (Cê- excelente, por sinal), onde ele canta em alto e bom som: você foi mó rata comigo!
A rata do Caetano é tatuada e exige rocks. Ratinha descolada, como tinha de ser. Parece ser um tipo intessante. Gênia, gata e etc. Mas ainda assim, uma completa e simplesmente rata demais (e provavelmente, de olho no seu parmesão recém adquirido).
Para as ratas e ratos.
Foto: acabou a festa (por Mariana David).
*
sexta-feira, 31 de agosto de 2007
. só eles sabiam .
O vento toca suavemente os galhos desnudos da árvore.
Ela sente. Se move. Deixa pousar.
Num movimento ilírico, permite que o vento passeie por suas dores, pelas suas formas retorcidas. É como se o vento circulasse por suas veias, por onde corre o sangue, onde pulsa o coração.
Aqui não se ouve uma só palavra. Estava tudo repleto de distintos silêncios, que caíam por cima das pessoas, que andavam com tantas pernas, tantas vozes, que sequer repararam que o vento e a árvore faziam amor, logo ali, por cima de suas cabeças.
*Para Jão*
*
Foto: a árvore e o vento (por Mariana David)
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
.Porque é um presente ou chama-se saudade.
. abandono do ver .
As lentes dificultavam o cair das suas lágrimas, e as fazia embaçar.
A chuva turvava tudo e a impedia de molhar a cara, pois lá estavam elas, como impecilhos para se experimentar o choro do céu.
Os beijos apaixonados vinham acompanhados de uma inevitável cegueira momentânea, pois não se pode pedir à pessoa que se beija que ela pare de respirar, muito embora sua blusa seja habitualmente transformada em meio de apagar as marcas do amor.
O que fazer quando o mundo que se vê não é o que se deveria ver? E afinal, existe uma única forma de se realizar as coisas? Será que realmente enxergamos alguma coisa? Por que tantos míopes, astigmatas, hipermétropes ? Não será uma necessidade imperiosa da natureza de colocar seres no mundo que são obrigados a verem as coisas de novas maneiras, a desenvolver outros sentidos, uma vez que a visão confunde nomes, tropeça pelos caminhos e veste a meia pelo avesso?
Ou somos azarados, condicionados a usar um par de lentes na cara, que lhe mostram um mundo que muita vezes, era melhor nem se ver. Talvez os tropeços fossem mais vantajosos quando se há tanta dor e tristeza nos corações das pessoas.
Andou pensando em abandonar os óculos, equecê-los no fundo de uma gaveta e passar a ver o mundo como ele se mostra a ela.
E sentir a chuva na cara, o beijo apaixonado e tropeçar nos sentimentos da vida.
No meio do caminho, sempre há umas pedrinhas. Pros que vêem e pros que não.
E afinal, quem vê? As lentes, ou olhos atrás das lentes?
*
Foto: Miopia iluminada (por Mariana David)
terça-feira, 28 de agosto de 2007
. a namorada do céu .
Cheguei à conclusão de que se é preciso imaginar para se poder viver de forma mais feliz no mundo. Que seríamos de nós, tão limitados no que se chama de corpo humano, se não pudéssemos criar novas formas de se enxergar a realidade, transformar as palavras, brincar com o que está pronto e acabado.
Fui, certa vez, á praia. Dia quente, ensolarado, muito banho de mar e crianças, tão magníficas, confundidas com os peixes na água. Não pude deixar de notar um menininho, de cuequinha branca, acompanhado pela irmã, que igualmente, vestia um maiô gasto pelo tempo. A menina, mais velha, ficou encantada com a minha câmera e se soltou a fazer poses e a gargalhar, depois de conferir a sua imagem congelada pela tecnologia que ela desconhecia. O garoto, alheio às modernidades e aos olhos curiosos, carregava uma pipa, que de tão rasgada, denunciava a experiência de muitos céus percorridos. Me parecia impossível se fazer voar aquela pipa, mas o menininho nem me deu bola: levantava para cima e para baixo, os bracinhos se esforçando e fazia a pipa voar. Ela subia e caía, e ele se encolhia todo, rolando de rir pela areia. Seus olhos brilhavam, me lembro muito bem, e me sentí uma tola por duvidar da capacidade do ser humano de expandir as limitações. Enxergar o mundo com os olhos do coração.Foi nesse dia que me dei conta de que a imaginação é a nossa ferramenta mais bonita para nos alegrar e trazer alegria aos dias cinzentos do mundo.
E eu ví muito bem, com esses olhos que teimam em enxergar mal, a pipa novamente tocar o azul do céu.
*
Foto: A namorada do céu (por Mariana David).
segunda-feira, 27 de agosto de 2007
. deixa o inverno pra mais tarde .
Eu adoro metáforas. Uso e abuso delas, para fazer as minhas descrições, associações e pra dar um certo charme a coisas aparentemente sem graça.
Não vou aqui enumerar as minhas inúmeras metáforas. Vim para escrever sobre outra coisa na verdade, mas tinha que render as devidas homenagens a esta ilustríssima figura de linguagem.
Andei reparando que as pessoas são como as estações. Algumas são como o inverno: frias, cinzentas, solitárias, e muitas vezes donas de uma grande beleza por trás de uma densa melancolia. Outras são como o verão: quentes, vibrantes, um tanto sufocadas de euforia. Sempre chegam invadindo, sem pedir licença, trazendo muito, muito calor. Escrevo isso porque acabo de ser invadida pelo verão, em pleno inverno (tudo bem que a Bahia não oferece um inverno clássico, mas vejam lá, peço licença poética). Quem sabe do que se trata vai entender o que vou dizer.
O verão vem, invasor nato, e chega: nos acorda bem cedo com o sol na cara e só vai embora lá pelo fim do dia. O verão queima, mas nos deixa mais bonitos. O verão pede água, tem sede, olha as mocinhas na praia e pede pra ficar. O verão tem uma beleza escancarada, e a esbanja em cada cantinho por onde passa. O mar fica mais azul, as pessoas sorriem mais, filhos são mais concebidos, há música por todos os becos, guetos e afins. O verão ilumina, é observador e quando cansa, se derrama no mar, exibido que é, esse verão.
E eu, que sou tão invernal, ando sentindo um calor danado esses dias.
Traz mais água, sim?
(Ao meu verão invasor)*
Foto: E o verão chegou ( Por João M. Meirelles).
domingo, 26 de agosto de 2007
. crianças são mais felizes .
Apresentei hoje à minha irmãzinha o Museu de Arte Moderna da Bahia, o Mam. Vimos uma exposição muito bonita, do Walter Smetak, um músico genial que criou diversos instrumentos inusitados, com sons excêntricos e muito delicados. Fui à inauguração desta exposição há uns dias atrás, mas confesso que vê-la novamente, acompanhada pelos olhos de uma criança, foi de uma delícia inexplicável.
Os instrumentos foram vistos na forma abstrata que possuem, desvinculados da obrigação de emitir o habitual reflexo sonoro, e foram anjos eólicos, ovinhos, pássaros com tetas, e tudo mais que o criador ousou de chamá-los. A minha irmã sequer estranhou os nomes, as formas. Achou tudo muito possível e me surpreendeeu com seus comentários. Um dele foi assim. Paramos em frente a um enorme instrumento, repleto de tubos com artefatos de flauta nas pontas, que deve ser tocado por várias pessoas ao mesmo tempo. Recebeu o nome de Pindorama. Minha irmã, olhou a obra enorme e largou essa: nossa, nunca tinha visto um instrumento chamado Pindorama. Agora conheço um. Ele tem o mesmo nome que o Brasil teve há muitos anos atrás, quando os índios moravam por aqui. Minha irmãzinha é demais. Inteligente ao extremo e de uma doçura que muito me ensina.
É muito bom ter os olhos livres para imaginar, sem as limitações que vamos nos impondo quando crescemos. A crinça cria, inventa palavras que não estão nos dicionários, acha que perfume tem cor, e que as cores tem cheiro. Pura sinestesia.
É bom estar com pessoas que ainda acreditam em alguma coisa, que riem com simplicidade e não exigem que o mundo seja de outra forma, que não a natural.
Foto: construtor de castelo (por Mariana David).
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Recomendo: Exposição de Walter Smetak no Mam.
E quem tiver filhos, primos, sobrinhos e crianças interiores, todos os domingos acontece lá uma sessão de pintura ao ar livre. Só chegar, pegar um pincél e pintar.
sábado, 25 de agosto de 2007
. a idade do tempo .
Acabo de assitir ao último documentário feito por Eduardo Coutinho, chamado O Fim e o Princípio. Coutinho leva a sua câmera e olhar cuidadoso a um pequeno povoado, Araçás Azuis, nos confins da Paraíba e colhe depoimentos dos moradores mais antigos da região.
O filme corre num ritimo lento, mas creio que essa tenha sido a intenção do Coutinho. Mostrar um lugar onde o tempo prescinde dos ponteiros do relógio, um lugar onde a temporalidade está vinculada às oscilações da natureza ( chuva e sol, poeira e carvão). É um lugar distante, quase esquecido, mas onde a memória reconstrói as dores, os sonhos e as vivências de pessoas. É ela o fio condutor das narrativas, o cheiro do passado ultrapassa a película e chega até a mim, e o que muito me impressiona é a simplicidade grandiosa das pessoas capturadas pela câmera. Quem fala tudo que sabe, fica besta, teoriza um senhor de idade, de fala embolada, mas de uma clareza que talvez nem ele mesmo saiba. Num lugar marcado pela fé cega num Deus que tudo vê, escuta e decide, trabalhar na roça é visto com algo que muita saudade deixou e a morte como um fim que necessariamente chega. A maioria ali, não teme a sua chegada.
O filme me trouxe uma sensação de rugas cansadas, de vozes rasteiras, e de como o ser humano existe em inúmeras possibilidades. Há uma procura pelo que não se tem, pelo que não se é, a câmera mostra uma quase referência mítica aos personagens que procura absorver. Gostei muito da falta de pretensão, de se escolher um lugar qualquer e deixar com que as pessoas derramem as suas estórias, os seus fragmentos, com cheiro de terra batida e sol quente.
Fiquei numa nostalgia interessante, por algo que não vivi, por algo que não presenciei, mas que me trouxe mais uma nova revolução do olhar. Gostei.
Foto: As mãos da minha Vó. (Por Mariana David)
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. das pessoas, e outros bichos afins .
Quando caminho pela rua, nutro uma especial tara em observar as pessoas. Sou praticante de um voyerismo declarado, a céu aberto e com luz do sol na cara. As pessoas, na correria obediente do que chamam de dia a dia, quase não me percebem. Aliás, posso estar também sendo observada, ter um olho mirado nas minhas estranhezas, ser o ratinho de laboratório no concreto solitário em que vivemos.
Gosto, ao esperar o sinal amigo do semáforo vermelho, de ver as pessoas esperando o momento para cruzar a rua. Gosto de ver um rapaz, roupinha de futuro executivo, mp3 devidamente ativado, conter o prazer de estar ouvindo uma música que só toca pra ele (e fico morrendo de curiosidade de saber o que se está ouvindo, o prazer quase escorrega para além fones de ouvido). As pessoas se tocam, no que eu chamo de dança dos inconscientes: as pessoas se veem, mas é como se estivéssemos todos imersos na solitude, num monólogo de mudos. Mas a cidade continua, esparramando suas cores confusas, suas esquinas delirantes, sua voz que não se faz ouvir, mas que ao mesmo tempo, nos deixa surdos.
E olho as pessoas: o casal de namorados que se beija na rua, a tia entediada num engarrafamento caloroso, os olhos de uma criança pelo vidro traseiro do carro (crianças são as mais pura forma de voyerismo: abstração do olhar), eu, tentando compreender tudo e chegando à conclusão de que é tudo muito maluco, doido mesmo, para que eu possa continuar a olhar. Mas acabo olhando, tentando descobrir porque a mocinha chora, porque o senhor de chapéu e barriga avantajada gargalha na saída da padaria. E o que, meu deus, o que aquela pessoa está fazendo no meio das pedras da praia de Ondina: palestrando com formigas?
Não tem jeito. As pessoas devem ser olhadas, capturadas. Estamos todos sujeitos às perversões e às loucuras de voyeurs descontrolados como eu.
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Foto: Vale do Capão, por Mariana David
( porque eu também me canso de olhar).
sexta-feira, 24 de agosto de 2007
. menina cor de sonho .
Um certo dia, lá estava eu, entediada com a faculdade de Direito, prestes a terminar o curso, e pensando com meus botões: não tem nenhuma criatura aqui neste curso que me dê vontade de chamar para tomar um café (eu não bebo café, só capuccino, mas acho legal as pessoas beberem café enquanto fazem hora para alguma coisa). E divagando nestes pensamentos nada jurídicos, me deparo com uma figura, vestido colorido, óculos modernoso e pensei: essa pessoa merece ser chamada para um café. Não chamei, mas acabamos engatando um papo, e conversa vai, conversa vem, descobrimos que tínhamos um francês em comum, uma tara habitual por filmes, um vício e imersões em mundos que os olhos das pessoas preguiçosas não conseguem ver. De lá, caímos em diversas formas de pulsar, auroras surrealistas, em jardins elétricos, em paraísos nada artificiais ( e andamos muito para isso!) ou simplesmente, no velho e guerreiro Mercado do Peixe, que acreditem, tem banheiro limpo e ainda fornece arco íris!
Hoje, esta linda menina, querida amiga, faz aniversário, e rendo aqui todas as minhas homenagens, reafirmo o meu amor por ela, meu carinho e de como a vida é mesmo uma boa foda: sempre dá um jeito das pessoas se encontrarem.
Talita é um dos meu melhores achados, é a minha boneca de brechó vintage, das que não se encontra por aí. Não confundam! Não é atrás de qualquer óculos modernoso ( e há tantos deles por aí) que encontramos tipos como ela.
E ela ainda tem cabelos cor de sonho. Me ganhou. Para sempre!
Parabéns, minha boneca colorida. Felicidade sempre.
E não esqueça:
Plante cores. Morda a fruta. Leve choque!
ui*
Foto: Talita auroreando, por Mariana David.
quinta-feira, 23 de agosto de 2007
. a bicicleta, ou essa sou eu .
Entre o presságio e o sonho
Uma janela indiscreta
por onde entra a brisa
que meus cabelos conserta
Entre o olhar perdido
e a linha reta
vejo surgir no horizonte
uma bicicleta
e a linha reta
vejo surgir no horizonte
uma bicicleta
(Ivan Seixas)
*
Começo o meu blog me traduzindo pelas palavras de um amigo, um gênio escondido atrás de um quase sucesso.
Assumo aqui a difícil tarefa de escrever, colocar meus filhos no mundo em forma de palavras.
O título me veio ao ver esta foto, nas minhas reminiscências de um saudoso carnaval pernambucano, quando eu observava o mar de Boa Viagem ( E só observava. Tive medo dos tubarões). Há uma bicicleta lá no fundo, beirando o mar, salgando as rodas, e que só foi percebida quando o momento deixou de existir, quando ele foi congelado em pixels, graças à tecnologia e também ao olhar atento do meu querido amigo Duda, paraibano e pernambucano, com um olhar extremamente sensível às grandes miudezas.
Sou um pouco como essa bicicleta. Pequena, quase um vestígio, um fragmento que passa e só deixa a suave brisa, das coisas que passam rápido. Mas, às vezes, me demoro, e paro a bicicleta na beira do mar, faço o vento parar, a roda descansar e me entrego à grandeza de ser só um rastro de qualquer coisa no horizonte.
Estou sempre entre o presságio e o sonho*
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